Mulheres no Setor Energético para a Justiça Climática

Crédito da foto: UK Department for International Development/CC BY-NC-ND 2.0

Crédito da foto: UK Department for International Development/CC BY-NC-ND 2.0

Por Vitória Wanner, Pesquisadora do EmpoderaClima

A vontade global de providenciar acesso universal à energia sustentável até 2030 (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 7) está criando diversas oportunidades para usuários e fornecedores de energia. No entanto, homens e mulheres não se beneficiam igualmente destas oportunidades; intervenções de fornecimento de energia tem sido tradicionalmente cegas em relação ao gênero.

Estudos dos últimos 20 anos, como mostrado no Boletim do Instituto Britânico de Estudos para o Desenvolvimento (IDS) de fevereiro de 2020, mostram que as necessidades energéticas dos homens e das mulheres divergem, particularmente em comparação a países em desenvolvimento. Além disso, a contribuição de mulheres para o planejamento, fornecimento e criação de políticas energéticas é mínima, já que empresas de energia são fortemente dominadas por homens.

Como usuários, as pessoas têm necessidades energéticas diferentes de acordo com seus  gêneros, e a cegueira em relação ao gênero tem muitas vezes ignorado as necessidades das mulheres. No artigo “Problemas de Gênero em políticas energéticas” de 1995, o atual Diretor Executivo de Pesquisa e Ação Integrada para o Desenvolvimento (IRADe), Jyoti Kirit Parikh, enfatiza a necessidade de entender melhor estes problemas para mulheres engajadas em diferentes setores, seja agricultura, transporte, indústria, doméstico ou o próprio setor de energia (ex.: produção de carvão, coleta de combustível e marketing de combustível).

No entanto, as necessidades energéticas das mulheres vão muito além de cozinhar, já que muitas outras tarefas domésticas são divididas por gênero, como coletar água, triturar grãos, lavar roupas e limpar. Ana Pueyo e Mar Maestre, no artigo “Conectando acesso à energia, gênero e pobreza”, enfatizam que o tempo de trabalho e remuneração das mulheres aumentam enquanto a eletricidade reduz o trabalho doméstico, e melhor iluminação aumenta a duração do dia, deixando mais tempo para outras tarefas produtivas.

Como fornecedores, o setor de energia é tradicionalmente dominado por homens. O artigo Nós Precisamos mais Mulheres no Setor de Energia, por Katie Mehnert, divulga que somente 15% dos empregados nos setores de petróleo e gás dos EUA são mulheres, e este número diminui ainda mais para cargos técnicos mais remunerados. A Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA) estima que a participação de mulheres no setor de energia renovável é maior que no setor de energia como um todo, empregando cerca de 32% de mulheres em comparação aos 22% do setor de energia em geral. Ainda sim, continua sendo significativamente menor que a participação dos homens, e menor ainda em empregos na área da ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM).

Sistemas de energia estão sofrendo uma mudança rápida, significativa e disruptiva; grandes tendências vindouras e positivas poderiam fechar os buracos de acesso energético ao redor do mundo, que incluem a descentralização da geração e distribuição de energia para alcançar áreas remotas e o aumento de empreendimentos de mulheres em países em desenvolvimento. Contudo, tendências como o aumento de população em assentamentos urbanos informais e cenários humanitários são problemáticas para o acesso de energia. 

De acordo com ENERGIA, um grupo de mulheres envolvidas com trabalhos de gênero e energia em países em desenvolvimento fundado em 1996, a desigualdade de gênero impede a alavancagem destas tendências para expandir o acesso de energia àqueles que mais precisam. Mulheres em países em desenvolvimento são mais impactadas por pobreza energética que os homens, e elas não têm as mesmas oportunidades que eles para tirar vantagem de oportunidades emergentes que podem ajudar a distribuir o acesso de energia para populações marginalizadas.

Uma pesquisa conduzida pela Intel® em 2013 mostra que um número menor de mulheres do que homens possuem celulares, têm acesso à finanças ou ao menos têm opinião em tomadas de decisões domésticas sobre energia.

Estas realidades dificultam o potencial para alcançar o acesso universal à energia sustentável até 2030, como previsto pelo ODS 7. Como o Boletim do Instituto Britânico de Estudos para o Desenvolvimento enfatiza, entregar energia sustentável para todos os homens e mulheres e seus filhos requer um foco maior em igualdade de gênero, tanto na entrega quanto aos beneficiários dos serviços de energia sustentável.

Alcançar uma transição justa e equitativa para um sistema de energia sustentável vai depender de esforços para resolver a desigualdade de gênero. Para tapar o buraco de acesso global à energia, governos e outros atores precisam alcançar as 1,6 bilhões de pessoas ao redor do mundo que não têm eletricidade e os 3,4 bilhões que não possuem soluções limpas para cozinhar.

Ainda que uma atividade significativa já esteja em andamento na intersecção dos ODSs mencionados anteriormente, a igualdade de gênero nem sempre está na frente de suas implementações. O Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (DESA) reportou que governos têm apontado para mecanismos legais e institucionais que existem para apoiar os direitos das mulheres e para a necessidade de integrar uma perspectiva de gênero em políticas e orçamento, mas estes esforços são bloqueados pelo baixo nível de mulheres nas tomadas de decisões das esferas públicas e privadas, além das normas sociais atuais que perpetuam a desigualdade de gênero.

A implementação da política global de mudança climática também enfrenta dificuldade para colocar mulheres no centro do acesso à energia renovável, como reportado pelo Boletim do Instituto Britânico de Estudos para o Desenvolvimento. Seguindo o Acordo de Paris, países delinearam ações pós-2020 para reduzir emissões, muitos dos quais traçaram esforços complementares para melhorar o acesso à energia.

Enquanto mais da metade das Contribuições Nacionalmente Determinadas (CNDs) submetidas por países africanos subsaarianos reconhecem a importância de um acesso barato e confiável à energia para o desenvolvimento, somente 40% das CNDs apresentadas fazem menção à igualdade de gênero ou mulheres. E dentre estes países, só alguns destacam a participação de mulheres em tomadas de decisões energéticas e programas de energia sustentável e treinamento, como declarado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

Energia é essencial para quase todos os aspectos de nossas vidas, mas tem diferentes significados para diferentes pessoas. Para entender as implicações relacionadas ao gênero de problemas energéticos, é importante levantar perguntas sobre papéis: quem faz o quê, quem é dono do quê, quem toma decisões sobre o quê e como, que vence e perde em uma intervenção planejada.

Este artigo mostra apenas um pedacinho da edição; convidamos nossos leitores a explorar mais a fundo o assunto e engajar com a rede de pesquisa do EmpoderaClima!

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