Precisamos falar sobre a saúde mental das mulheres e as mudanças climáticas
Por Ruth Hollands, pesquisadora na EmpoderaClima
Precisamos falar sobre saúde mental. Enquanto o mundo continua se adaptando e tentando mitigar as consequências da crise climática, os efeitos das mudanças climáticas sobre a saúde mental estão ficando cada vez mais comuns. A pandemia da COVID-19, aumentos contínuos de temperatura, eventos climáticos extremos e outros efeitos das mudanças climáticas contribuíram para o aumento da eco-ansiedade, uma condição psicológica na qual uma pessoa pode sentir estresse, luto, desamparo e medo da incerteza associada com uma visão negativa do futuro de nosso planeta. A crise climática afeta negativamente a saúde mental, agravando as vulnerabilidades de comunidades marginalizadas, incluindo mulheres, as quais já enfrentam consequências desiguais devido às mudanças climáticas.
De acordo com o Dr. Joshua Morganstein, Diretor Assistente do Departamento de Psiquiatria na Uniformed Services University, depois de um desastre, as respostas psicológicas mais comuns são aflição, reações como insônia, desvio de culpa, irritação, comportamentos perigosos e perda de interesse por atividades comuns. Assim, a eco-ansiedade pode exacerbar problemas de saúde mental. A Associação Psicológica Americana (APA) estabeleceu a definição oficial de eco-ansiedade e a descreveu como um medo crônico de ruína ambiental. Estresse de eco-ansiedade pode causar depressão, ansiedade e sentimentos de perda de autonomia e identidade pessoal. Em resumo, problemas de saúde mental estão crescendo devido aos efeitos negativos das mudanças climáticas.
As mulheres continuam entre as mais afetadas em relação aos impactos das mudanças climáticas, como você já deve saber pelos nossos outros artigos originais da EmpoderaClima. Mulheres, jovens e pessoas com status socioeconômico baixo têm se mostrado mais vulneráveis à ansiedade e distúrbios de humor relacionados a desastres. Por exemplo: durante enchentes, mulheres, especialmente aquelas que fazem parte de uma minoridade étnica ou que possuem níveis de escolaridade mais baixos, tornam-se particularmente suscetíveis a doenças mentais.
Uma pesquisa a partir de 28 estudos feitos pelo Carbon Brief sugere que mulheres são muito mais propensas a sofrerem doenças mentais relacionadas ao clima. Estudos regionais mais específicos mostram que mulheres encaram um risco maior que os homens de sofrer transtorno do estresse pós-traumático (TEPT) após ciclones tropicais nos Estados Unidos, Austrália e Myanmar. Além disso, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), as mulheres são o maior grupo afetado por TEPT, e isso está conectado a uma alta taxa de violência sexual ao redor do mundo. Relacionado a isso, estudos mostram que violência sexual contra mulheres pode aumentar durante e após eventos climáticos extremos. Além de TEPT, mulheres também costumam enfrentar maior risco de depressão e angústia emocional após eventos climáticos extremos.
Temperaturas mais altas resultantes das mudanças climáticas também ameaçam a saúde mental. Durante as enchentes de 2005 no Paquistão, 80% das pessoas deslocadas por eventos climáticos eram mulheres. Com 90% do Lago Chad na África Ocidental seco, mulheres nas regiões do Chad, Nigéria, Níger e Camarões têm que andar cada vez mais longe para buscar água todo ano. Em relação às temperaturas crescentes, os efeitos negativos de temperaturas maiores que 30°C sobre a probabilidade de dificuldades de saúde mental é maior em mulheres. Enquanto mulheres não desenvolvem transtornos diferentes de homens, suas vulnerabilidades sociais as colocam em maior risco, aumentando sua susceptibilidade a doenças relacionadas às mudanças climáticas.
De acordo com o estudo O Impacto das Mudanças Climáticas sobre a Saúde Mental da Frontier in Psychiatry, mulheres com status socioeconômico baixo, em pobreza, com recursos econômicos e sociais escassos, redução de suporte social e problemas de saúde mental prévios a desastres climáticos fazem parte de grupos vulneráveis que tendem a desenvolver novos transtornos mentais ou ter seus problemas já existentes agravados após enfrentarem um evento traumático resultado das mudanças climáticas. Fora isso, porque mulheres já são marginalizadas em espaços de tomada de decisões de todos os níveis, suas necessidades continuam sendo ignoradas ou sub-representadas, exacerbando vulnerabilidades relacionadas às mudanças climáticas.
Eventos climáticos extremos aumentaram na última década e continuarão a aumentar. Adaptar e mitigar as consequências das mudanças climáticas, gênero e justiça climática em espaços-chave é crucial. Sendo um grupo vulnerável à crise climática, mulheres ao redor do mundo ainda estão lutando para ter suas vozes ouvidas e suas necessidades atendidas. Novos estudos sobre saúde mental destacam a seriedade da saúde pública global, mas enquanto o reconhecimento e compreensão de saúde mental aumentam, especialmente em um mundo pós-Covid, tomadores de decisões e a comunidade global devem focar em continuar a comunicar e educar o público sobre esses riscos.
Precisamos falar sobre saúde mental. Educação e reconhecimento são imperativos para ajudar a tratar e prevenir problemas mentais relacionados à crise climática. Dra. Susan Clayton, Diretora de Psicologia na Faculdade de Wooster e autora na 6º avaliação do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), insiste que todos “se informem… descubram quais efeitos das mudanças climáticas são mais prováveis de acontecer na sua área. Pode ser deprimente, mas às vezes as pessoas catastrofizam sobre o fim do mundo e informações acuradas podem servir de alívio - pelo menos reduzem incertezas (que contribuem para a ansiedade climática).” Compreender a eco-ansiedade pode deixar as pessoas à vontade, porém estes tipos de riscos de saúde global não serão resolvidos se as comunidades vulneráveis continuarem a ser marginalizadas nos espaços de liderança climática.
A correlação entre a crise climática e a saúde mental, especialmente quando se fala de desigualdades de gênero, é recente. Já que os dados disponíveis são tão novos, logo limitados, precisam ser realizadas mais pesquisas para estudar especificamente como os eventos e desastres climáticos afetam a saúde mental, especialmente daqueles em comunidades vulneráveis, incluindo mulheres negras e indígenas. No entanto, não é segredo que, ao redor do mundo, populações estão enfrentando eventos e desastres naturais extremos todos os dias, colocando a saúde pública em risco rapidamente.
Socialmente e culturalmente, a saúde mental ainda é estigmatizada em muitas partes do mundo, exacerbando problemas mentais relacionados à crise climática ao passo que os desastres climáticos e as temperaturas continuam aumentando. Mulheres encaram muitos obstáculos graças às mudanças climáticas, e a única forma de reduzir esses obstáculos (e eventualmente eliminá-los) é elas terem oportunidades e direitos justos em espaços de tomada de decisões a nível local, nacional e global.
A Eco-ansiedade é real e, se realmente quisermos empoderar mulheres para tomarem a frente em ações climáticas, devemos abordar a saúde mental na crise climática. A temperatura global e os oceanos se elevam, e as mulheres da Terra também.